A Palavra de Deus do Vigésimo Nono Domingo do Tempo Comum nos
remete ao tema da oração, nossa relação direta com Deus, do discipulado, nossa
relação direta com Jesus Cristo, e da missão, nossa relação direta com o
mundo, nesta mudança de época!
Falar de oração, em nosso tempo, nem sempre é
fácil. As pessoas de nosso tempo falam umas com as outras, como nunca antes.
Mas como se comunicam? Basta observarmos um pouco, pessoas em encontros sociais,
de trabalho ou no simples hodierno: elas (as pessoas) falam com diversas outras
pessoas ao mesmo tempo. Temos diante de nós, pessoas que falam conosco, sim,
porém, com um ou mais celulares ou outros aparelhos da modernidade de um mundo
tecnologicamente avançado, porém virtual, conectados!
Encontrar um sentido novo, mais
burilado em nossa forma de rezar, é talvez, a intenção da Palavra de Deus deste
domingo, desde Moisés no Livro do Êxodo, de Jesus no Evangelho de Lucas e dos
conselhos de Paulo em sua Segunda carta a Timóteo. Afinal, a oração
é o meio mais eficaz de dialogarmos com Deus. E na qualidade de nossa oração,
que encontramos ou não, a confiança no
amor de Deus para conosco. Só nos abrimos de todo coração, em quem
confiamos de verdade. Só nos sentimos felizes e à vontade com quem amamos e
queremos bem. O desabafo é sinal de confiança; significa confiar nossas
aflições a alguém que sabe ouvir, entender e aceitar nossas limitações e
fraquezas, que não poucas vezes nos levam a crises, angústias e depressões. Ou
seja, a oração surge dos momentos nossos de todos os dias. Daí a
importância da consciência de vivermos em oração sempre, dialogando com Deus
que nos ama loucamente e seguramente quer estar em constante comunicação
conosco.
Para rezar, é preciso situar-nos num
contexto. Como realidade absoluta de Deus; e Deus é inacessível à nossa
realidade. Por isso, não devemos “negociar” com Ele; seria a mesma coisa, como
falar num telefone desconectado. Se nossa realidade íntegra (total) não contém
uma referência interna de Deus, e se não interferir em todas as ordens, nossa
relação autêntica será impossível. Por isso, vivemos numa exigência interna de
Deus (cf. Santo Agostinho de Hipona). São Paulo afirma: “Cristo é a imagem visível de Deus que é invisível” (cf. Cl 15). A
forma como Deus chega pessoalmente até nós, é o amor ao próximo; daí nunca
esquecermos o novo mandamento do Amor!
Por outro lado, na relação com Deus,
não há nenhuma mediação legal, nem ritual (cf. Hb 8,8-12; Jr 31). Deus se
relaciona com a pessoa através de uma lei escrita no Antigo Testamento, através
de uma estrutura social, de preceitos. Agora já não está a lei fora da pessoa,
e sim dentro, em seu interior. Por isso, a relação de Deus com a pessoa se faz
de forma direta, profunda, em seu interior, em seu coração que significa o
mais profundo do ser humano. Com Paulo VI poderíamos dizer, que Deus adentra ao
“sacrário humano, a consciência da pessoa”, e mergulha aos porões de sua
intimidade, para soprar-lhe do silêncio de seus dóceis lábios, uma declaração
de amor ao ouvido de quem está disposto a acolhê-lo.
Uma das formas místicas e belíssimas
de dialogar com Deus é o próprio silêncio, num mundo tão conturbado e
barulhento. “Deus é de longos silêncios e
raras palavras...”. Não podemos correr o risco de não ouvir o que Deus tem
a nos dizer.
Conta uma pequena estória, que em
determinada Igreja, por volta do meio-dia, um homem entrava na Matriz e
sentava-se no último banco. Nada dizia. Apenas ficava sentado lá, olhando para
frente, sem pestanejar. As zeladoras daquela Igreja, preocupadas, achando que
poderia tratar-se de um mal-feitor, pediram que o padre falasse com o homem. Ao
perguntá-lo o que fazia todos os dias, no mesmo horário, no último banco da
Igreja, ouviu do homem simples: “Senhor
Padre, venho aqui todos os dias e olho para Ele e Ele olha para mim. Tem algum
problema que eu faça isso?”. O padre retrucou: “Mas o senhor olha para
quem, se a Igreja está sempre vazia quando vem aqui?”. O homem concluiu: “Eu olho para Jesus! Não é ele que está
naquela caixinha dourada (sacrário)?”. O padre envergonhado passou a fazer,
desde aquele dia, companhia mais assídua, em espírito de oração, a Jesus
Sacramentado.
Mas a Palavra de Deus, que trata com
delicadeza o tema da oração, quer mais: nossa oração não pode ser
individualista, pidona ou simplesmente preceitual. A oração precisa produzir
frutos com sabor de justiça, já que o Reino de Deus é um reino de justiça.
Logo, onde não há justiça, não há Reino de Deus. Nossa oração deve refletir
esperança aos que são oprimidos, pobres, enfermos e desolados. Oração sem
confiança não produz esperança. E comunidade sem esperança é inútil. Como diz o
Papa Francisco, não passa de uma ONG piedosa.
Assim sendo, nossa oração deverá trabalhar nosso discipulado e nossa
missionariedade, justamente neste Mês Missionário!
Sejam todos sempre muito abençoados. Com ternura e gratidão, meu
abraço,
Pe. Gilberto Kasper
(Ler Ex
17,8-13; Sl 120(121); 2Tm 3,14-4,2 e Lc 18,1-8)
Fontes: Liturgia Diária da Paulus
de Outubro de 2016, pp. 53-56 e Roteiros Homiléticos da CNBB do Tempo Comum II
(Outubro de 2016), pp. 45-49.