Meus queridos Amigos
e Irmãos na Fé!
Neste Segundo Domingo da Quaresma, somos convidados a subir a montanha com Jesus e três dos seus discípulos
para contemplarmos o mistério da glória de sua transfiguração. Por instantes,
a eles é revelado que Jesus glorificado é o salvador esperado e que transformará nossa
condição humana em realidade glorificada. Imagino que os discípulos deram uma espiadinha no céu.
A visão da transfiguração de Cristo nos convida a “prestar ouvidos ao eleito Filho de Deus”, se quisermos ter forças no discernimento das ações que edificam
o mundo segundo o projeto do Pai. A Palavra de Deus, neste dia, nos descreve a parábola ou nos desvela o grandioso
plano salvador de Deus.
A contemplação do Senhor transfigurado ressalta que “a fé cresce quando é vivida como
experiência de um amor recebido e é comunicada como experiência de graça e de
alegria. A fé torna-nos fecundos, porque alarga o coração com a esperança e
permite oferecer um testemunho que é capaz de gerar: de fato, abre o coração e
a mente dos ouvintes para acolherem o convite do Senhor a aderir à sua Palavra a fim de se tornarem seus discípulos” (Carta Apostólica
Porta Fidei de BENTO XVI, n.7).
Neste domingo da transfiguração,
Jesus nos convida a escutar o que ele tem para nos dizer e a contemplar seu
rosto luminoso. Firmes e cheios de fé no Senhor, celebremos a sua páscoa, que
se realiza nos grupos e pessoas dispostas a transformar para melhor a realidade
de cada um e a vida do povo sofrido.
As leituras nos motivam a abrir o coração às promessas de Deus,
que se preocupa e sempre quer fazer aliança conosco. Chamados a participar da
glória do Senhor, escutemos o que hoje ele nos diz. E o que Jesus, o Filho amado do Pai nos diz ao coração, à luz do Ano Santo? Que nos amemos uns aos outros, e pronto. Isso parece simples,
mas não é fácil. Amar o diferente, amar quem nos trai, amar quem nos difama e
não nos perdoa, amar o inconveniente e o que nos faz sofrer... Mas é o que Jesus espera de cada um de nós.
Deixar-nos enviar implica num prolongado
compromisso com nossas Comunidades, que são convidadas a serem bússolas que
orientem, através do testemunho, da coerência e do bom senso, todos ao Cristo transfigurado!
Na aliança com Abrão, Deus promete
descendência e terra. A transfiguração de Jesus é prenúncio da glória que a
humanidade toda deseja. Estamos a caminho da transformação, mas para isso é
necessário empenho e renúncia.
Na caminhada da vida, por vezes, uma
decisão importante, a realização de um acontecimento, é precedida por crises,
trevas e expectativas. Jesus, como exímio Mestre, insistia que os discípulos deviam caprichar
no seguimento e tomar a cruz de cada dia. Contudo, para eles, essa conversa da
cruz e que ele tinha que sofrer para entrar na glória não fazia parte de seu
imaginário e de sua compreensão. As palavras do Mestre sobre a cruz implodiram
as esperanças messiânicas e a decepção foi geral.
A transfiguração se traduz na
revelação de que o caminho da glória passa pela cruz. A glória efêmera de um
atleta, que no alto do podium recebe a medalha de ouro, é precedida por
renúncias e sofrimentos alimentados pelo sonho de ser vitorioso.
Envolvidos pela luz da glória, Jesus e os representantes da
antiga aliança, Moisés e Elias conversam sobre o seu êxodo em Jerusalém.
Enquanto isto, Pedro só tem olhos para a glória deslumbrante. Quer chegar à
glória por um atalho que evite a cruz. Conosco isto acontece frequentemente.
Não raras vezes pulamos etapas. Até pisamos sobre os outros para chegarmos, por
atalhos à glória do prestígio, daquilo que chamamos de cargos, funções,
honrarias e poder, seja no âmbito eclesial, político e social. Geralmente tais
comportamentos, tais atalhos, são desastrosos e fazem muitas pessoas sofrerem
por conta de nosso egoísmo e infidelidade na missão que nos foi conferida.
Ao discípulo não compete inventar um
caminho particular que evite a hora desagradável da cruz. Cabe-lhe assumir e
andar junto com seu Mestre no mesmo itinerário. A transfiguração passa pela
prova de um rosto desfigurado pela angústia para um rosto glorificado.
Esta Segunda Semana da Quaresma nos propõe profunda conversão em nossa missão, sobretudo ministerial. Discípulos do Senhor que querem chegar à transfiguração pessoal, deverão descer da montanha e assumir a realidade. Muitos
gostariam de permanecer, como Pedro, lá na montanha, diante da glória. Jesus dá outra orientação: descer ao hodierno, não contar nada a
ninguém, e assumir com amor e dedicação incondicional a missão que nos é
confiada. Muitas vezes não compreendo como nós ministros ordenados deixamos
pessoas morrer sem nossa absolvição, unção dos enfermos; deixamos de atender as
pessoas que nos procuram para reencontrarem a paz interior, porque nos ocupamos
com tarefas que nem mesmo condizem com nosso Sacerdócio ordenado. Com quanta
frequência deixamos de presidir a Eucaristia para nossas Comunidades, porque
precisamos passear. Com quanta facilidade gastamos mal o dinheiro com coisas
desnecessárias, ou não enviamos o valor realmente arrecadado nas coletas, como
no caso da que faremos nesta Quaresma: A Coleta da Solidariedade no Domingo de Ramos?
Enquanto agirmos sem uma profunda conversão e o resgate da clara noção de
justiça em relação ao dinheiro da Comunidade, teremos a coragem profética de
pedir maior justiça e transparência por parte de nossos Governantes, tantas
vezes muitos deles, corruptos e desonestos, desviando recursos a benefícios
pessoais? Oxalá esta Quaresma lapide, moldando-nos ao Mestre que nos escolheu para seu
discipulado e não se decepcione ainda mais com nossa prostituição por dinheiro,
fama, prestígio e bem estar descabido. Quando utilizo o termo “prostituição”
não me refiro à sexualidade, mas à negação da própria consciência, princípios e
valores, como acontece com tanta frequência em nossa Política que ou se
prostitui aos partidos em demasia, ou não sobrevive ao esquema desonesto.
Sejam todos abençoados e com ternura, o abraço amigo e fiel,
Pe. Gilberto Kasper
(Ler Gn 15,5-12.17-18; Sl 26(27); Fl 3,17-4,1 e Lc 9,28-36).
Fontes: Liturgia
Diária da Paulus de Fevereiro de 2016, pp. 72-76 e Roteiros Homiléticos da CNBB
da Quaresma (Fevereiro de 2016), pp. 31-37.