O Relacionamento
Humano Digno, sem dúvida, passa por uma profunda crise. Animalizou-se o
“Humano”, remetendo a pessoa a um egoísmo ímpar. Penso que deveríamos fazer algumas releituras:
precisamos reler o Estatuto da Criança e do Adolescente, que na minha modesta
opinião é aplicado erroneamente. Precisamos reler a educação precária oferecida
às crianças, aos adolescentes e jovens de nosso País. Precisamos reler a
possibilidade de pré-adolescentes poderem exercer algum trabalho antes dos 16
anos de idade, ao invés de tentar reduzir a “Maioridade Penal”, engaiolando
adolescentes em penitenciárias indecentes e desumanas, que jamais re-socializam
pessoas, antes alvoroçam ainda mais o instinto animal dos amontoados de
detentos, ociosos, sem nada para fazer e sem as mínimas condições de repensarem
suas vidas. E não por último, é urgente que o Estado assuma sua fragilidade,
sua incapacidade, seu descaso e seu covarde modo de tratar os cidadãos, sem o
mínimo de dignidade.
Por que não utilizar os bilhões de
reais desviados, e que ainda não foram devolvidos aos cofres públicos, para
repensar o Sistema Penitenciário de nosso rico Brasil? Se nas Penitenciárias
houvesse Fábricas, Oficinas e Escolas eficientes, os detentos trabalhariam e
aprenderiam algum ofício, durante o cumprimento de suas penas. Ao invés de
obrigar os brasileiros a contribuírem com o “Auxílio Penitenciário”, cada
detento honradamente sustentaria sua família, pagaria suas despesas, enquanto
presos, que não são pequenas, e ainda teriam uma poupança, quando de volta à
sociedade, certamente melhores do que entraram. Isso é possível, porque conheço
Penitenciárias européias que o fazem. Em Novo Hamburgo (RS) onde cresci havia
uma Fábrica de Calçados na Penitenciária e todos aprendiam a fazer sapatos e saiam
com emprego garantido. Hoje há tantas maneiras de profissionalizar ao invés de
animalizar as pessoas. Saem discriminados e a única alternativa é voltar ao
crime!
Comecei a trabalhar aos 10 anos de
idade. Trabalhava durante o dia e estudava à noite. Ao contrário do que afirmam
alguns demagogos idealistas, não fiquei traumatizado por isso. Foi uma honra
para mim, poder contribuir com a manutenção da sobrevivência de minha família,
sempre muito pobre, mas feliz e agradecida a Deus pela saúde e pelas oportunidades
que nos eram proporcionadas. Aliás, meus irmãos e eu tivemos o privilégio de
estudar os primeiros cinco anos do Ensino Fundamental, na época chamado de
Primário, numa Escola particular de Religiosas. As Irmãs não nos cobravam as
mensalidades. Em troca da gratuidade, nós três limpávamos as salas de aula
todos os dias e aos sábados fazíamos uma limpeza geral. Eu só tinha cinco anos
de idade. Enquanto nossos colegas pagantes iam almoçar, nós ficávamos para a
limpeza da Escola. Depois as Irmãs nos ofereciam um saboroso almoço. Tal
“permuta” seria hoje um escândalo. Mas preciso admitir, que para mim e meus
irmãos, a medida foi construtiva e nos ajuda até os dias de hoje a sermos
agradecidos por tudo que de graça recebemos, até mesmo os desafios e as
dificuldades econômicas pelas quais sempre passamos. Não somos melhores do que
ninguém e somos portadores de muitas fragilidades e defeitos humanos, mas fomos
educados a um exemplar Relacionamento Humano Digno com quem quer que convivamos!
Pe. Gilberto Kasper - Teólogo